17 Maio, 2017 15:10

Uespi: Primeira Liga LGBT do Brasil comemora um ano de luta e reivindicação de direitos

O grupo universitário nasceu com o propósito de fomentar discussões científico-social referente a gênero e sexualidade

Um ano se passou. Olhar para todo o caminho percorrido mostra o quanto a primeira Liga LGBT universitária do Brasil, que pertence à Uespi, avançou na ocupação de espaços, nas discussões dos direitos e no combate a despatologização das identidades LGBT’s.

Constituída por estudantes e professores do Centro de Ciências da Saúde (CCS), a Liga Acadêmica de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgênero (Liga LGBT), nasceu com o propósito de ocupar espaços acadêmicos com discussões científico-social referente a gênero, sexualidade, e demais temas que englobam as desmistificações de preconceitos e tabus na sociedade heteronormativa.

Aula inaugural da liga LGBT com a presença da vice-reitora Bárbara Melo (Foto: Arquivo Uespi)

Segundo seus membros, a liga foi idealizada a princípio como coletivo. O presidente discente da liga, Jakonilson Di Araújo, aluno do curso de psicologia, destaca que a ideia era reunir estudantes e apoiadores para debater assuntos relacionados a comunidade LGBT. “Era para ser um grupo de estudo, um coletivo. Uma coisa bem nossa mesmo”, explica.

Outra membro da Liga, Thays Vale de Sousa, também estudante de Psicologia, lembra que na semana científica de Psicologia e Medicina da UESPI, realizada meses antes do nascimento da Liga LGBT, houve uma discussão sobre sexualidade e gênero, que foi crucial para a criação do grupo. “A partir disso, surgiu a ideia de montarmos um coletivo. Isso foi se ampliando e no meio das discussões, acabamos querendo criar uma liga, com caráter de coletivo”, conta.

De acordo com a presidente docente da Liga, Ângela Carvalho, o grupo começou sem ter noção do nível de repercussão e proporção que o projeto tomou. “Eu fui convidada pelos estudantes que estavam com interesse em criar um grupo, um coletivo. Mas nas discussões percebemos que o ideal era se instituir como uma liga acadêmica”, conta a professora.

Roda de conversa da liga LGBT no Parque da Cidadania em Teresina (Foto: Arquivo Pessoal)

No mês de maio de 2016, foi realizada a aula inaugural da liga com o “saiaço” no auditório do CCS, que marcou o início de tudo. Na programação, aconteceram debates sobre gênero, políticas públicas, direitos da comunidade LGBT e performances de Drag’s Queen piauienses. Este foi o pontapé para o grupo começar a promover aulões, rodas de conversas, talk shows, bem como participar de eventos científicos e suas atividades ganharem visibilidade nos veículos de comunicação locais.

Jakonilson, presidente da liga, enfatiza que o apoio dos professores envolvidos no projeto foi essencial na construção e realização de eventos. Uma equipe multiprofissional esteve com os estudantes desde o início das primeiras atividades.“Eles que produziam toda a programação e nos ajudava com os convidados. Quando comecei a liga eu não imaginava que as coisas tomassem essa proporção”, conta emocionado.

Ele acrescenta que a liga também surgiu com propostas que não se limitam apenas à expressar e discutir a opção sexual. “Ela surgiu de uma expressão política. Porque nós que somos de movimentos sociais, somos politizados. E eu acredito que nós só vamos avançar nos nossos direitos se a gente mostrar que existe”, declara.  Segundo ele, a liga busca a promoção de cidadania, saúde, direitos, além de um mundo justo. “ Um mundo onde caiba nossas lutas e nossos sonhos”, afirma o presidente discente.

 A primeira Liga LGBT do Brasil

Credenciada como um projeto de extensão universitária, o grupo é considerado a primeira Liga LGBT acadêmica oficialmente registrada. Ela tem o intuito de dar visibilidade ao público LGBT presente dentro das instituições de ensino superior, e estimular pesquisas, trabalhos e debates. De acordo com o presidente discente, Jakonilson Di Araújo, hoje a articulação dos membros está voltada para formalização da liga, com a aprovação do estatuto e um edital para a nova diretoria.

Como primeira liga LGBT universitária do Brasil, a missão tem sido dialogar com os membros e com grupos de apoio, como também fortalecer o surgimento de outras ligas. A docente Ângela Carvalho ressalta que o grupo é uma iniciativa pioneira a nível de Piauí e Brasil.

Membro da coordenação do centro LGBT de Teresina, Victor Koslowski durante o aulão da liga na Uespi (Foto: Arquivo Uespi)

“A existência de uma liga acadêmica ligada aos diretos humanos e a população LGBT é muito importante. A gente sabe que a homofobia e as dificuldades de lidar com as diferenças são realidades ainda muito presentes na sociedade”, pontua Ângela. Para ela, a universidade é um espaço privilegiado de formação de pensamento. ” É mais do que pertinente a universidade se colocar como produtora de respeito as diferenças e ao exercício da sexualidade”, acrescenta.

Segundo Jakonilson, a mobilização de grupos em torno de causas LGBT está em voga há cerca de dois anos. “Isso é muito recente. Já haviam coletivos de negros, feministas, de mulheres e outros. Mas grupos para as pessoas se assumirem LGBT é bem novo.  Além de ser muito complicado, porque a gente se expõe muito enquanto universitário”, adverte.

Atualmente, a liga possui 45 membros, com participação de alunos da Psicologia, Medicina, Fisioterapia, Educação Física, Enfermagem, Comunicação Social e Ciências Sociais  e, conta com apoio de parceiros como a Pró-reitoria de Extensão, Assuntos Estudantis e Comunitários da UESPI; a Presidente da Comissão da Diversidade Sexual da OAB, Ana Carolina Magalhães Fortes; o Conselho Regional de Psicologia;  o membro da coordenação do Centro LGBT de Teresina, Victor Koslowski; o Grupo de Transexuais e Travestis do Piauí (Gptrans) e os grupos de apoio a causa LGBT.

 Espaço de luta e reafirmação de identidades

Com um ano de existência, a liga LGBT já foi homenageada com o título em Direitos Humanos “Antônio de Noronha”. A menção honrosa prestava o reconhecimento da UESPI à entidades e personalidades que atuam na área dos Direitos Humanos no estado do Piauí e desenvolvem ações para a promoção da igualdade, representatividade e respeito às diferenças. Além disso, em outra ocasião, os membros também receberam a visita do Cônsul dos Estados Unidos, Richard Reiter, momento em que foram parabenizados  pelo trabalho desenvolvido.

Presidentes da Liga LGBT com o cônsul dos Estados Unidos Richard Reiter (Foto: Arquivo pessoal)

Para Jakonilson, a liga abriu muitas portas. “Foi nela que eu descobri a união do espaço acadêmico com as causas do movimento LGBT. Hoje faço um TCC na área que quero. E é possível a gente ta na universidade, se reafirmando e lutando pelo direito dos nossos iguais através de nossas produções acadêmicas”, pontua.

Talks show realizado pela liga acadêmica durante o ano de 2016 (Foto: Arquivo Uespi)

A aluna e membro da Liga, Thays Vale, vê a liga como um espaço de militância e existência. “É um espaço de reivindicação de direitos, construção de saberes. A liga representa a derrubada de certos muros da universidade ”, destaca. De acordo com ela, os aulões e performances de Drag’s Queen da liga mostrou para o ambiente universitário a quebra de estereótipos entre gêneros, levando discussões para outras pessoas com informações que antes se restringiam ao grupo LGBT. “ A Liga ele é um espaço de autoafirmar, de escutar a vivencia do outro, rever a sua própria vivência e construir saberes a partir disso”, salienta.

A liga é um local de desconstrução e empoderamento, segundo Ícaro Amorim, do 4º período de Psicologia. “ Mesmo eu sendo do movimento LGBT, ainda estava carregado de estigmas e preconceitos que somente com as vivências fui me desconstruindo e aprendendo”, conta. Para ele, a liga é um espaço que se faz fundamental na universidade. “É essencial que uma instituição de professores, profissionais da saúde tenham esta sensibilidade, conhecimento e manejo, para discussão de temas tão atuais e necessários”, finaliza.

Autoria: Valéria Soares
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