07 Março, 2017 11:41

DPE-PI presta homenagem às mulheres evidenciado perfis que se destacaram na história

Divulgação
Ilustração Esperança Garcia (Divulgação)

Neste mês em que se comemora o Dia Internacional da Mulher, em 08 de março, a Defensoria Pública do Estado do Piauí presta uma homenagem diferente à todas as mulheres que ajudam a construir a história da Instituição, com uma referência a mulheres que se destacaram no cenário estadual e nacional por sua história de luta, conquista de direitos e empoderamento. Vamos falar sobre Esperança Garcia.

Vivesse nos dias atuais Esperança Garcia teria o exato perfil de uma assistida pela Defensoria Pública. Pobre, negra, humilhada, sofrendo abusos e perseguições, representando claramente uma pessoa à qual foram negados todos os direitos básicos. Vivendo na região de Oeiras, na fazenda de Algodões, a mais ou menos 300 km de Teresina, ela se destacou da sua condição de escrava por ter sido corajosa a ponto de redigir uma das mais antigas petições brasileiras, vinda em formato de carta ao então Governador do Piauí, Gonçalo Lourenço Botelho de Castro, denunciando os maus tratos sofridos por ela, seus filhos e suas companheiras de infortúnio. A carta é datada de 06 de setembro de 1770.

Provavelmente tendo aprendido a escrever quando vivia nas fazendas administradas pelos padres jesuítas, que naquela época foram os maiores responsáveis pela alfabetização ou por noções de escrita aos escravos e índios catequizados, e certamente em um momento de relaxamento dos responsáveis pelo cerceamento dos seus direitos, Esperança Garcia conseguiu produzir a carta e através dela deixar registrado, mais de 100 anos antes da abolição da escravatura, seu nome na história do Piauí.
No documento ela denunciava os maus tratos sofridos e pedia algo muito simples, fácil de resolver, queria voltar a morar na fazenda onde vivia seu marido, para que juntos pudessem criar os filhos, queria ter o direito a se confessar, queria ser vista como gente, queria respeito.

Sobre a homenagem, a coordenadora do Núcleo Especializado de Defesa da Mulher em Situação de Violência, defensora pública Lia Medeiros do Carmo Ivo, diz que “conhecer ou relembrar a história dessa e de outras mulheres guerreiras e ousadas nos fornece combustível para seguir lutando e trabalhando da melhor forma possível. O mês de março deve ser um mês de reflexão. É importante conhecermos a trajetória de mulheres que, com coragem, disposição e muito sacrifício, abriram espaço para tantas conquistas. Ainda falta muito, temos muita luta pela frente, mas devemos continuar, inspirando-nos nos exemplos do passado e presente e com vistas a formar novas realidades a serem comemoradas no futuro”.

“Ao destacar a história de Esperança Garcia nessa homenagem às mulheres que nos ajudam diariamente a construir a Defensoria Pública do Estado do Piauí, sejam elas assistidas, estagiárias, colaboradoras, servidoras ou defensoras públicas, queremos mostrar a força inerente a toda mulher, que diariamente busca fazer valer seus direitos ao tempo em que vai à luta para garantir melhores condições de vida para si mesma, seus filhos e muitas vezes seus parceiros, já que são muitas as que hoje estão à frente da condução dos seus lares, o que não ocorria no passado. A data da carta de Esperança, a qual a primeira vez que li senti um misto de orgulho e admiração, foi transformada no Dia da Consciência Negra em nosso Estado, um reconhecimento para aquela que teve tantos direitos negados e nem por isso se deixou abater. Que a cada dia mais e mais Esperanças possam se insurgir contra qualquer forma de discriminação e preconceito e estejam certas todas elas que encontrarão na Defensoria Pública o apoio que precisam nessa luta por respeito e igualdade”, afirma a defensora pública geral, Francisca Hildeth Leal Evangelista Nunes.

Confira abaixo a Carta de Esperança Garcia, redigida com o português vigente da época e contendo todos os desvios literários que só servem para atestar sua originalidade, veracidade e relevância:

“Eu sou hua escrava de V. Sa. administração de Capam. Antº Vieira de Couto, cazada. Desde que o Capam. lá foi adeministrar, q. me tirou da fazenda dos algodois, aonde vevia com meu marido, para ser cozinheira de sua caza, onde nella passo mto mal. A primeira hé q. ha grandes trovoadas de pancadas em hum filho nem sendo uhã criança q. lhe fez estrair sangue pella boca, em mim não poço esplicar q. sou hu colcham de pancadas, tanto q. cahy huã vez do sobrado abaccho peiada, por mezericordia de Ds. esCapei. A segunda estou eu e mais minhas parceiras por confeçar a tres annos. E huã criança minha e duas mais por batizar. Pello q. Peço a V.Sª. pello amor de Ds. e do seu Valimto. ponha aos olhos em mim ordinando digo mandar a Procurador que mande p. a fazda. aonde elle me tirou pa eu viver com meu marido e batizar minha filha .

Autoria: Ângela Ferry
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